PÃO É SAGRADO
Adilson Nunes de Oliveira*
Um dos
alimentos mais antigos de todos os povos e sobre o qual ainda há uma certa
mística é, sem dúvida, o pão .
Os mais
velhos dizem-no “sagrado” e simboliza ,ao que parece, todos os demais alimentos
– o pão nosso de cada dia.
Entre
aqueles sempre há o hábito de repartir o pão com as crianças ou o não colocar
pedaços de pão fora. São ensinamentos que vem atravessando gerações.
O pão velho
era guardado em latas para ser consumido, torrado, transformando-se em farinha
de rosca,ou, ainda, nos famosos “pudins de pão”, nas sopas de pão, ou nas
célebres rabanadas de Natal .
Quando caído
em lugar impuro o pão era alimento de animais, muitas vezes molhado em leite,
não esquecendo-se de beijar (isso mesmo, beijar), a fatia de pão antes de dar
ao animal. Como possibilidade extrema, na ausência de um animal para comê-lo,
era o pão enrolado em papel e, assim, envolto em respeito, colocado na lata de
lixo.
Muitas vezes
encontrado na rua, deveria ser posto em lugar protegido num canto de uma casa,
na beira de uma janela, na esperança que um passarinho qualquer fizesse uma boa
refeição.
Provavelmente
todos esses comportamentos sejam inspirados no cristianismo. Jesus na última
ceia, repartiu o pão – “este é o meu corpo”. “Fazei isto em minha memória”.
Antes, multiplicou os pães. Em ambos os fatos, houve outro alimento – primeiro
o peixe, depois o vinho. Mas foi o pão
que a tradição carregou consigo. Veja se o caso da comunhão na Igreja Católica
ou a festa de São Antonio, com o pão bento.
Há vários anos, presenciei um fato curioso e até emocionante.
Eu vi um
homem abrindo ao meio alguns pães, uns trinta. Recheando-os com queijo e
presunto. Sem entender nada, aos poucos vi crianças chegando. Nesse dia, eram
uma quinze ou mais. A todos o homem estendia a mão e lhes entregava um daqueles
pães. O homem não era Jesus.
Mas um homem
que não andou com Jesus , mas o seguiu.
O homem era Pedro. Poderia ser um Pedro qualquer, um Silva, brasileiro
qualquer. Não fora essa característica especial: esse ato de repartir, todas as
tardes, o pão com as crianças. Crianças que, vezes, à tarde, só tem a tarde.
Eu disse que
o homem era Pedro. Não, é Pedro, sim. Pedro Silva.
Pedro Silva
todos conhecem, o Pedro do Restaurante do Parque de Exposições do Sindicato
Rural de Dom Pedrito.
É ele que
todas as tardes, reparte, há muitos anos, o pão com cerca de trinta crianças.
Pois é.
Pedro Silva, no sábado seguinte ao fato que narrei, ofereceu um almoço às
crianças e alunos da APAE.
Gestos
bonitos, como esses, precisam ser imitados.
Fica, com
certeza, no sorriso e no silêncio das crianças, a gratidão. E, nestas linhas
que agridem a modéstia do “ seu” Pedro, o agradecimento
por ter me permitido viver esse belo gesto.
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(Pedro Silva faleceu em maio de 2017)
N.B. Com este artigo , marcamos presença na recente antologia da Academia de Letras dos Municípios do Rio Grande do Sul, , publicação intitulada "Simpatias, Superstições , Sortilégios e Advinhas "e que foi lançada no final de novembro de 2018, no Auditório Ana Terra , da Câmara de Vereadores , de Porto Alegre/RS
* Professor universitário e museólogo. Presidente da Sesmaria Cultural de Dom Pedrito , articulista e intérprete musical. Ocupa a Cadeira 118-Profa. Manuela Freire - na Academia de Letras dos Municípios do Rio Grande do Sul.
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