quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

FERMINA PEDROSA


                              A VINGANÇA DE FERMINA PEDROSA

                                                                                                                                     Adilson Nunes de Oliveira *

Lá vai ela, pelas ruas de Dom Pedrito, “perfumada, de rouge e batom”. Pintada em excesso, adereços em profusão, colares vários, pulseiras muitas, anéis múltiplos. E chapéu, sim e sempre, chapéu.E flores.
"Lá vai ela", grita a criançada, a Fermina Pedrosa, assustando as crianças e divertindo os mais velhos. Um tipo popular servindo de chacota a uns e outros.
Lá vai ela, aquela que viraria lenda a ultrapassar o tempo. De um lado, um ser apolíneo busca constante da beleza, ainda que caricata. De outro, aqueles que a irritavam, provocando-a, o lado demoníaco da história. O povo se divertia com ela; e ela, com o povo.
Muitas vezes, levaram-na a surtos, como na ocasião em que simularam seu casamento. Havia, recém-chegado à cidade, um jovem militar, carioca, manso na fala e tentador no olhar, homem bonito, por quem seria muito fácil qualquer mulher se apaixonar. E Fermina Pedrosa se apaixonou. Simularam um casamento, para a pobre mulher um casamento para o povo todo assistir um evento, sem dúvida.
Na frente da igreja matriz, montaram os genuflexórios, forrados de tecido branco e decorados com rosas, como merecia a cerimônia. Um gordinho atarracado, com um pesado livro na mão direita e usando vestido de uma viúva, já estava pronto para realizar a celebração.  Vestiram um jovem, com uniforme do 14º Regimento...Grande público se formou, então. Montada, a cena não podia ser mais perfeita, muito mais ainda diante do coração enamorado de Fermina Pedrosa. Ia tudo tão bem... mas, na hora do “sim”, dois brigadianos irrompem da multidão e prendem o noivo, pondo fim ao “espetáculo”. Resultado: a noiva entrou em surto! E foi tão violento e de tal maneira inusitado, que todos entraram em pânico...
Outro episódio foi em 1923, quando o povo (malvado!) a convenceu de que havia sido eleita Rainha do Carnaval. Até fantasia encomendaram a uma modista. Um vestido branco, com luas e estrelas bordadas, que lembrava as noites claras de janeiro. Cetro na mão, meio trêmula, e um chapéu (claro, tinha que ter um chapéu) quase que de cangaceiro. Muita pintura, muitos adereços, assim ela percorreu ruas e visitou casas, seguida por um séquito de malandros.
Recebida com música, comes e bebes, ou como se dizia na época, “todos a brindaram com um copo d’água”. Porém, em alguma casa lhe deram, para beber, um laxante! O resultado não carece descrever.
Assim, o povo se divertia com ela, e ela, com o povo, numa cumplicidade mútua, demoníaca e apolínea.
Viveu no século XIX, lá por 1850 e pouco, até início dos anos 40, sempre com sua marca muita pintura, muitos colares, pulseiras, chapéus e flores...
 E assim virou dito popular, proferido por quem muitas vezes nem sabe a origem. Quando alguma senhora aparece muito enfeitada, logo não falta alguém que lance a alocução: “Estás igual à Fermina
Pedrosa”, lembrando o que guardado perdura no imaginário popular.
Essa é a grande vingança a toda a maldade: todos nós de Dom Pedrito temos uma tia, uma prima, ainda que distante, a quem cabe, perfeita e merecidamente, o título de FERMINA PEDROSA.
Uma fênix que ressurge no momento menos esperado, mas aparece , em grande estilo.
Demos um “Viva” a todas as Ferminas Pedrosa que andam redivivas por aí.

          ESSE É O TEXTO COM QUE MARCAMOS PRESENÇA  NA ANTOLOGIA DO CÍRCULO            DE PESQUISAS LITERÁRIAS - CIPEL-   RECENTE PUBLICAÇÃO INTITULADA ,                       "MULHERES, NA HISTÓRIA, NAS ARTES E NAS CIÊNCIAS " exemplares que  distribui 
          entre alguns amigos, na BOLARIA  DONA ZEILA 


* Professor e museólogo. Diretor do Museu Paulo Firpo, Coordenador da VI Região Museológica. Articulista  e intérprete musical.

Nenhum comentário:

Postar um comentário